Como psicólogo clínico, apesar de atuação ainda não prolongada e de experiência até certo ponto resumida, recebo uma demanda de atendimento para, geralmente, tratar de uma queixa velada e não aceitável socialmente, encoberta por outra queixa mais aceitável e superficial. Na maioria das vezes, a queixa principal é de origem sexual.
Ter uma queixa de natureza sexual é duplamente constrangedor, porque nossa cultura costuma oscilar entre dois extremos quando o assunto é sexo: o extremo da repressão ou moralidade e o extremo da valorização do gozo ou exacerbação sexual.
O que significa estes extremos?
Os tabus da sexualidade provocam a impossibilidade de nos apresentarmos diante do sexo com seriedade e mente aberta. Uma vez uma sexóloga veio a Santa Cruz do Capibaribe-PE, convidada pela ASCAP, para ministrar um minicurso de sedução para as mulheres. Eu trabalhava numa das empresas que apoiaram a iniciativa, e por isso, não apenas tive contato com a doutora, como estava vendendo as entradas para o evento. Cada pessoa, que chegava para adquirir o ingresso, vacilava entre a euforia e a vergonha. Um senhor de idade mediana, que comprou o ingresso para sua esposa, esboçou uma reação rígida e impenetrável ao informar o que queria, quase jogando o dinheiro, tudo aos olhares da sexóloga.
Quando aquele senhor se retirou, ela não se conteve com as palavras: “este senhor foi muito hilário... como quem desprezasse as fantasias sexuais”, e alfinetava “vocês aqui não transam não é?”. Ela, ao perceber que eu ainda era um adolescente, com espinhas no rosto, e pelo menos naquele momento, não conseguia conter uma risada, diante de sua reação, se voltou e argumentou: “você acredita na cegonha? Pois devia, porque é verdade”.
Então, ainda vivemos nesses extremos, desde a Dr. sexóloga, do auto de sua arrogância de saber e exacerbação dos desejos e da valorização sexual, não se permite respeitar o semelhante, os moralistas e repressores do sexo não admitem que alguém que tenha alguma disfunção sexual se importe, quiçá se preocupe em tratá-la.
No entanto, não será novidade se em alguns dias algum médico diagnosticar seu paciente como sofredor de transtorno hipersexual, ou até mesmo do transtorno sexual hipoativo. Ambos serão inseridos no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais Quinta Edição (DSM-5), que será lançado em 2013.
Segundo o psicanalista Contardo Calligaris, o DSM-5 vai colocar o todo e qualquer sujeito em um padrão fora da “normalidade”, visto que ter alguma forma de excitação sexual de 30 minutos a duas horas diárias com ou sem parceiro, ou de 2 a 5 vezes por semana o tornará um hipersexual. Caso contrário, o médico poderá lhe diagnosticar como um hipoativo sexual, já que não existem critérios definidos para a hipoatividae.
Até para a medicina a vida sexual saudável não é vista sem tabus: entre o padre e a polícia, a ciência ou o DSM “não promove valores, mas quer apenas controlar e regular”, compreende Calligaris.
Psicólogo Ulisses Nascimento.
Nenhum comentário:
Postar um comentário