Nosso trajeto é a PE 390, que liga Serra Talhada até Floresta. Até onde a vista alcança a cor da vegetação é cinza, o gado que insiste em sobreviver anda sem rumo pelo pasto seco ou mesmo no meio da rodovia com o semblante de quem esta pedindo socorro. Pássaros descansam da luta inglória por um pouco d’água, que não existe, em cima do galho do imbuzeiro e com o bico se abrindo para o céu esperam uma chuva que não vem e a qualquer momento caem do galho para a morte no chão.
Muitos animais mortos, principalmente o gado que sucumbiu à procura do resto de água barrenta e podre que fica depositada no fundo do açude, atolado na lama preta, não consegue sair e ali mesmo está selado o seu destino.
Este é o triste cenário do semiárido pernambucano nos 121 municípios afetados pela estiagem. O agricultor sertanejo, mais uma vez, assiste a tudo impotente vendo a lavoura de milho e feijão se perder totalmentsem chuva. Segundo a Agencia Pernambucana de Águas e Clima (APAC), não há previsão de chuvas até o final do ano.
Onde está o milho?
O Governo do Estado procura tomar as providências. O governador Eduardo Campos quer conversar com a presidente Dilma e já mandou uma carta pedindo mais recursos para os que recebem ajuda do Bolsa Estiagem. Na próxima quinta-feira, o Comitê Integrado de Convivência com o Semiárido faz uma reunião, em Serra Talhada, com entidades que atuam no combate à seca e representantes dos produtores.
Os agricultores já sabem o que vão dizer. Querem cobrar as promessas feitas com toda pompa, na última reunião da Sudene, que aconteceu aqui em Recife, como a distribuição de alimentos para animais (o milho que não chega nunca) e a regularização do abastecimento feito por carros-pipa (usados pelos políticos para atender às lideranças que são mais fiéis na hora do voto).
Carro-pipa para poucos
O fato é que nem Chapéu de Palha nem reuniões na esfera estadual ou federal amenizam, a curto prazo, as necessidades imediatas de água para beber, que os agricultores estão sentindo hoje. “Seu” Gustavo Emiliano da fazenda Salinas, distrito de Floresta, lamenta a perda do feijão e relata que está ali há 20 anos e nunca viu uma estiagem como esta.
“Carro-pipa só recebi aqui uma vez, ainda assim porque o caminhão quebrou na frente da porteira e para não perder a água, que estava derramando, o motorista encheu minha cisterna. Mas a água tinha outro destino e a cisterna agora esta totalmente vazia há dias”, afirmou.
O produtor rural e advogado Euclides Ferraz, que me acompanhou durante toda a reportagem, também revela que a situação não é nada fácil para aqueles que têm um pouco mais de renda e conseguem furar um poço na propriedade.
“Ficamos assistindo entristecidos e impotentes essa situação, por mais que tentemos ajudar, cedendo água do poço pelos menos para as pessoas beberem, o gado fica sem água. É muito triste ver todos os açudes vazios e os animais morrendo”, relata Euclides.
Prefeitos temem o pior
Os prefeitos das duas cidades onde fizemos a reportagem, Serra e Floresta, dizem temer que o pior venha acontecer. O desabastecimento pela falta de carne dos bovinos, caprinos e ovinos, maior produção de alimentos da região.
O prefeito-eleito de Serra Talhada, Luciano Duque (PT), avalia que se continuar como os institutos que acompanham as previsões climáticas prevêem a perda do rebanho será total e os produtores que ainda conseguem matar a sede dos animais por estarem à beira de um rio ou com poço na propriedade, não vão dar conta da demanda e o pior pode acontecer.
“Nosso agricultor está sem renda, recebendo do Garantia Safra, mas isso é insuficiente, nós esperamos que a situação venha a piorar, pelos prognósticos da falta de chuva nos próximos meses. Podemos ter a dizimação do rebanho, o que representa o caos. Nós não temos a cultura de armazenamento de alimentos, a gente sempre esperou a chuva para escoar a produção e isso pode trazer a falta de alimentos para a população dos centros populacionais.”
A prefeita reeleita de Floresta, Rorró Maniçoba, diz que o maior objetivo dela neste segundo mandato é levar água para a zona rural. Ela diz que não vai parar de procurar o ministro da Integração, Fernando Bezerra, o DNOCS, CODEVASF, Governo do Estado nessa batalha para obter recursos. “O município de Floresta está passando por uma seca nunca antes vista na região, a situação é dramática.”
Adutora do Pajeú do nada para lugar nenhum
Em todo o percurso que nos fizemos 98 quilómetros da PE 390 ela estava lá, para deixar ainda mais revolta no sentimento de abandono que vive o sertanejo, diante da maior seca dos últimos anos, perante as autoridades governamentais - a Adutora do Pajeú.
A canalização chama a atenção pela extensão e pelo complexo de obras. Com 402 km de tubulação a adutora têm ainda 12 estações elevatórias. A água estava para ser captada do lago de Itaparica nesta primeira fase, até Serra Talhada e deveria estar pronta no mês passado. Segundo Fernando Ciarline Teixeira, do Departamento Nacional de Obras Contra a Seca (DNOCS), o excesso de burocracia está acarretando o atraso da obra.
“Foram muitos entraves burocráticos, necessidade de mais aditivos para serem pagos à construtora e ainda um pequeno entrave com a Celpe”, disse. Diante desse depoimento, não vale nem a pena esperar pela promessa dele de que esta primeira fase da obra será concluída até meados de novembro, mas se isso acontecesse poderíamos ter uma esperança a mais na solução imediata deste problema que é ver animais sem rumo e com um destino de morte, tão perto de uma canalização que leva a vida (água) para o sertão.
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